segunda-feira, 27 de março de 2017

madrugada





 (1)
 
]
portal disfarçado em tempo
rasga mortalha incandescente e que devora
absurdos coerentes

desigual
desvão que s'esvai
na atmosfera que nos conecta aqui

marco.zero
órbita particular
estado de estar em si

sendo
somos
mais que presença em si

sem teia.temporalis
ares pintados de azul.marinho
escondem nossos quintais

pinto a rua com esse canto subentendido
aberto
só pra te acordar por dentro

insólita lua que nos irmana
a poupar manhãs descarnadas de viço
em franca elegia.menina

disparo olhares.bala
pra inexplicar sombras vazias
e abandono antes.depois

planto vestígios azuis
pra te mostrar que fio
sonhos encantados nas sendas de teu sono, já sem frio

[

 
Andréa Mascarenhas
 
27.03.2014
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 (1) Foto: acervo particular da autora (Cachoeira - BA).

quinta-feira, 23 de março de 2017

[ feliz, noite ]




















  (1)






orquestra de violões . cheiro de música antiga, invade . farol em desapego de noites . ruínas de hoje . madrugadas em que deito teu sono, em claro . de tanto, pouco . de pedros, heranças . sem vestido ou glória, histórias . corais, só ecos de mar . sinos: independência dissonante . silêncio in.sepulcro . nunca te gerei no tempo.templo . nascimentos e escuros . serão ventos esgarçados de dor que tomam as frentes . jamais predomina em mando alheio . palavras.flor, cerimônias . lágrimas vermelhas em rios de dentro . justiça e direito secam antes de correrem . cascatas ondeiam teus temores . sem resgate, salvo liberdades e folhas . aleluias entre.mundos ganham almas quase de mãos dadas . canto novo se entoa sobre oceanos . suprimentos de esperança, qual chuva necessária se derramam, quem sabe, quando amor for moeda mais que junção de sen.tidos . santos, carurus e prata . fogos de artifício espocam, tristes . bambinos choram e ainda nascem nus, sem nome . mundo.mundis, vasta ilusão in.escrita . capítulos marginais não mais se perdem . enganam fossos de byte . livro, vida e cânone: invençSÃOões . já não sei se se salvam ternura e inocência . meus olhos alheios dizem: ainda morre na praia infância esquecida . desterros enganam . chaves, cadeados, fronteiras .



Andréa Mascarenhas



25 e 28.12.2016



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(1) Fonte da imagem: acervo particular da autora.












quarta-feira, 15 de março de 2017

[SOU ESCRITORA]








(1)




 
À primeira vista, são dois termos aparentemente simples e fáceis de escrever ou dizer. Não! Por trás desse par de palavras existe uma atitude difícil de inspirar, formar, nascer, erguer e se sustentar, fôlego que custa a passar pela garganta, enfrentar os lábios e o mundo fora deles. 

Salvo algumas louváveis iniciativas de iniciação e fomento à literatura, desse lado nordestino do mapa, ainda não há uma formação acadêmica, da graduação ao doutoramento, voltada para a escrita artístico/literária, como já existe pelo mundo e no país, a exemplo da PUC do Rio Grande do Sul.

Desde há muito, escrever, por aqui - na Bahia, especificamente, é ofício quase sempre paralelo à carreira jornalística e/ou docente. Fora dessas áreas, escritor@s autônom@s costuram seus caminhos de escrita com muitos fios, pontos e nós, quase sempre produzindo e custeando seus livros. 

Dizer e se sentir escritorA, sim, com esse A maiúsculo, em aberta simbologia à mulher e à criação feminina, custa-nos caro há séculos. Sabemos, ao modo próprio de cada experiência, o que tivemos/temos que aglutinar, abrir mão, esquecer ou unicamente sonhar ao lado do esparso exercício da escrita, não menos significativa por conta dos percalços enfrentados e dos tabus paulatinamente derrubados.

Acredito que esta seja a primeira vez que expresso publicamente a frase SOU ESCRITORA, pois as atitudes e os atos de aprendiz de feiticeira - das artes mágicas da palavra -, exercito desde setembro de 1995, quando estava na universidade, conhecendo por dentro o mundo das Letras. A escrita informal e não artística já praticava desde a adolescência, época dos diários, agendas e cartas. Hoje, mesclo a escrita literária entre o papel/manuscrito, as revistas e os espaços virtuais.

O verbo ser qualificado, que se presentifica na frase, qualifica também cada ser que assume a responsabilidade com a escrita artística. Sim! Trata-se de grande compromisso humano a labuta de modelar palavras arredias, diuturnamente, em e com ideias, pensamentos, imaginação, cores, contornos, pinceladas, fazê-las outras, do avesso, cheias quando vazias, secas quando úmidas, solares quando lunares, cortantes quando líricas, brandas quando quentes, multidimensionais quando rasas, velhas e novas, (re)carregadas de sentidos, simbologias, sons e silêncios... 

Eis aqui uma pequena demonstração do que o ofício e/ou a profissão de escritorA requer do (e produz no) ser que toma pra si uma prática tão humana. Em meio ao que escrevemos vamos nos modificando - leitorA, autorA, fuidorA. E, letra a letra, escrevemos um mundo outro, com os outros. 

Condição sine qua non para enfrentar a vida, a cada palavra (re)modelada, a partir dos idiomas que tentamos domar, vamos nos (re)modelando em seres humanos mais complexos, mais atentos e sensíveis: ao tudo, ao nada, ao imperceptível, ao invisível, ao disfarçado, ao camuflado, ao "óbvio", ao protocolar, ao informal, ao despretensioso, ao velado, ao escondido, ao subliminar, ao maquiavelicamente inventado etc., matérias que fazem morada, queiramos ou não, nas entrelinhas cada vez mais autônomas d@s noss@s escrit@s viv@s.

Através desse texto rendo tributo à Confraria Feminina de Poesia e Artes, associação da qual faço parte, idealizada pela querida Confreira Rita Queiroz, que abre espaço para diversas mulheres - artistAs/escritorAs.


| SÊ.já escritorA |


Andréa do N. Mascarenhas Silva




03/12/2016



Professora de Literatura (UNEB). Edita o Blog literário Arquivos.. impertinentes (Blogspot). Classificou-se em 13º lugar no 'XII Festival de poesia, crônica e conto' (Fund. Cultural de Imperatriz – Maranhão, 2001). Ministra oficinas de criação literária. Publica prosa e verso em veículos impressos e eletrônicos, nacionais e internacionais. Participa do Dicionário de escritores contemporâneos da Bahia (2015) e da versão eletrônica do Projeto Mapa da Palavra.BA 2016 (FUNCEB).
 
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(1) Imagem: https://www.facebook.com/549339315255685/photos/a.549347815254835.1073741828.549339315255685/559747770881506/?type=3&theater